O ministro Marco
Aurélio, do STF, indeferiu a liminar em habeas corpus e manteve a execução
penal contra advogado Carlos Eduardo Paes Barreto Chagas, condenado por
retenção indevida de autos processuais. A pena foi fixada
pelo tribunal estadual em seis meses de detenção e dez dias-multa. Chagas foi denunciado por prática ilícita prevista no artigo 356 do Código
Penal, porque retirou do cartório da 9ª Vara Cível da comarca do Rio de Janeiro
os autos processuais de uma ação cível em que era réu. A autora da ação cível é
a juíza Tula Corrêa de Melo Barbosa. O advogado Chagas ficou com os mesmos por sete meses, sem tê-los devolvido. "Foi
uma longa via crucis" - diz um dos julgados do TJ carioca sobre o
caso. Anteriormente, a 5ª Turma do STJ indeferira uma liminar pedida pelo mesmo
advogado, por considerar que o trancamento de ação penal por meio de habeas
corpus é medida excepcional e que a denúncia de sonegação tem elementos
suficientes para a caracterização do delito. O pedido
de liminar foi feito pela OAB do Rio de Janeiro. Segundo a
decisão do STJ, o advogado “atuando
em causa própria, em ação de reparação de danos movida contra ele, reteve o
processo por mais de sete meses, sem autorização, pois o pedido de vista fora
do cartório teria sido indeferido”. O STJ considerou que a alegação de que o advogado não foi intimado para
devolver o processo “se mostrava absolutamente impertinente, pois estaria
demonstrado ter ocorrido a intimação, tanto que fora assinado o termo de
compromisso”.Ao analisar o pedido no STF, o ministro Marco Aurélio citou premissas da
decisão do TJ-RJ para rejeitar o pedido da defesa. Na ocasião,
aquele colegiado observou que o advogado em causa própria já havia perdido o
direito à vista dos autos fora de cartório, mas obteve nova vista no dia 15 de
setembro de 2006. Informou ainda que o advogado tornou a reter indevidamente os autos, que só
foram reavidos no dia 22 de maio de 2007, cerca de sete meses depois, apesar de
intimado em 26 de outubro de 2006.Ao rejeitar a liminar, o ministro Marco Aurélio ressaltou que “o quadro não
está a ensejar providência visando o afastamento da execução da pena imposta”. A OAB-RJ - que foi a impetrante do habeas corpus - sustentava que "não
há justa causa para a condenação do advogado à pena de seis meses de detenção,
somada ao pagamento de dez dias-multa", e questionava a legalidade da
ação penal tanto no STF quanto, anteriormente, no STJ. Depois da manifestação da Procuradoria-Geral da República, os autos voltam ao
STF para o julgamento do mérito. (HC nº 104.290 - com informações do STF).
Veja aqui a íntegra da decisão do ministro Marco Aurélio
HC 104290 - HABEAS CORPUS
Origem:RJ - RIO DE JANEIRO
Relator:MIN. MARCO AURÉLIO
PACIENTECARLOS EDUARDO PAES BARRETO CHAGAS
IMPETRANTE : ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
COATOR SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DECISÃO
PROCESSO – RETIRADA DE CARTÓRIO – PECULIARIDADES – DEVOLUÇÃO – RESISTÊNCIA –
ARTIGO 356 DO CÓDIGO PENAL – LIMINAR INDEFERIDA.
1. A Assessoria prestou as seguintes informações:
O paciente foi denunciado pela suposta prática da conduta prevista no artigo
356 do Código Penal (Inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir
autos, documentos ou objeto de valor probatório, que recebeu na qualidade de
advogado ou procurador), porque haveria retirado da serventia da 9ª Vara Cível
da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro processo cível que lá
tramitava e não os teria devolvido (folhas 24 e 25). Recebida a denúncia e
concluída a instrução processual, sobreveio a prolação de sentença condenatória,
que foi reformada pelo Tribunal de Justiça, no tocante à dosimetria da pena,
que restou fixada em 6 meses de detenção e 10 dias-multa. Consta da inicial que foi impetrado, contra o referido acórdão, habeas corpus –
de nº 137.420 – no Superior Tribunal de Justiça. A Quinta Turma indeferiu a
ordem porque: a) o trancamento de ação penal por meio de habeas é medida
excepcional, somente admitida nas hipóteses em que se mostrar evidente a
ausência de justa causa, a inexistência de elementos indiciários demonstrativos
da autoria e de materialidade do delito ou a presença de alguma causa
excludente de punibilidade; b) no caso, a denúncia contaria com elementos
suficientes para a caracterização do delito de sonegação de papel ou objeto de
valor probatório, porquanto o paciente, atuando em causa própria em ação de
reparação de danos movida contra ele, reteve o processo por mais de sete meses,
sem autorização para tanto, pois o pedido de vista fora do cartório teria sido
indeferido; c) a alegação de o paciente não haver sido intimado para a
devolução do processo se mostrava absolutamente impertinente, pois estaria
demonstrado ter ocorrido intimação, tanto que assim fora assinado o termo de
compromisso (folha 13 a 22).
Neste habeas, põe-se em discussão o questionamento acerca da adequação dos
fatos à norma. Indaga-se se a conduta típica do artigo 356 do Código Penal
consuma-se com a mera demora na restituição do processo somente ocorrida após a
intimação do advogado e a recusa na devolução. Afirma-se que a conduta típica
somente é implementada mediante a recusa do agente em restituir o processo,
depois de intimado a devolvê-lo na forma prevista na legislação processual.
Diz-se que a conduta só é relevante penalmente se demonstrada a intenção do
agente de não devolver os autos que obteve na condição de advogado. Desse modo,
impunha-se a expedição de intimação para proceder-se à devolução e comprovação
da recusa. Afirma-se a inexistência de justa causa para ação penal, uma vez
que, intimado, o paciente devolveu, imediatamente, o processo do qual teve
carga, consoante certidão de folha 55. A impetrante assevera que o paciente se encontra na iminência de ser submetido
à execução penal, cujo início do cumprimento da pena está agendado para o dia 7
de junho de 2010 (folha 58). Pede a concessão de liminar, para o fim exclusivo de determinar ao Juízo da
Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro o sobrestamento do processo de
execução, até o julgamento definitivo do habeas. No mérito, pleiteia o
reconhecimento da atipicidade da conduta imputada ao paciente, com a
consequente declaração de falta de justa causa para a ação penal e nulidade
absoluta do processo-crime a que esse respondeu.
2. Observem as premissas da decisão proferida pela Quinta Câmara Criminal ao desprover
a apelação interposta (folha 41):
[...]
Advogado em causa própria – que já havia perdido o direito à vista dos autos
fora de cartório e mesmo assim obteve nova vista em 15.09.06, tornando a reter
indevidamente os autos, que só foram reavidos em 22.05.07, cerca de 7 meses
depois, apesar de intimado em 26.10.06 e após longa via crucis.
[...]
Então, o quadro não está a ensejar providência visando o afastamento da
execução da pena imposta.
3. Indefiro a liminar.
4. Colham o parecer da Procuradoria Geral da República.
5. Publiquem.
Brasília – residência –, 11 de junho de 2010, às 16h45.
Ministro MARCO AURÉLIO
Relator